O outro lado da margem…. – trecho retirado da entrevista de Cacá Bueno

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Mário está agindo bem porque ele segue as diretrizes de quem entende de saúde. Eu, como não entendo nada de saúde, não posso falar nada sobre voltar ou não. O que eu acho que a gente teve um plano de afastamento, de reclusão, de distanciamento social, mas acho que o governo foi extremamente falho, pois a gente não teve, dentro das organizações de saúde, um plano de retorno. Temos um plano de afastamento, de distanciamento, mas não existe claramente um plano de retorno, enquanto em outros lugares do mundo sim. A gente sabe que estamos atrasados em relação à pandemia, então é mais grave. Acho que o posicionamento é correto, mas precisamos de um plano de retorno para tudo.

Jogador de futebol tem que preocupar com a família dele, tem que se preocupar com a saúde dele, mas também tem que preocupar quando retorna. Ele não é essencial, assim como a minha profissão também não é – não estão tendo as corridas de automóvel – mas, ao mesmo tempo porque tem muita gente na rua trabalhando? Porque as empresas estão retornando, fábricas funcionando? Até alguns setores não tão essenciais estão trabalhando de alguma maneira. Então nós temos que entender como voltar com segurança. Trabalhar para conversar e entender como voltar com segurança, e quando. Alguém, que entende do assunto, vai falar: “Cacá, com segurança, é no dia 18 de julho (por exemplo)”. Até dia 18 de julho eu sento aqui, e espero que quem entenda me dar a notícia de como vamos voltar. Mas eu não vejo isso.

O que eu vejo é a discussão de “temos que voltar” e “não temos que voltar” mas ninguém discutindo como voltar, como agir. Então eu penso que é essa é a relação que está faltando. Não acho que seja o Mário que deva decidir isso, nem presidente de nenhum outro clube. Eu acho que quem comanda as prefeituras, os governos, a saúde, é que tem que dizer para gente: “olha, vocês vão voltar com segurança dessa maneira”. Ah, mas o risco é zero? Não, não é. Vocês terão o risco de alguém se contaminar. Mas dentro dos protocolos? Se alguém se contaminar, nós vamos conseguir afastar ele rapidamente?  Ele não participa do grupo de risco? É tentar nortear para o que a gente saiba o que fazer. Alguém que entenda do assunto falar sobre o assunto.

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Não sou 8 nem 80 do que todo mundo tá falando. Não estou nem do lado do cara que está querendo voltar amanhã e nem do lado do cara que está dizendo que não vai voltar agora. A discussão para mim é completamente outra: como voltaremos? Ou vamos ficar em casa para sempre? De alguma maneira teremos que voltar. Saúde em primeiro lugar sempre, protocolos para fazer. Mas temos que ter um plano de retorno. Existiu um plano de afastamento, e estamos todos afastados. Daqui a pouco eu vou ter que mandar meus mecânicos embora. A galera está trabalhando em carros de corrida e a gente não teve corrida ainda. São muitas famílias que dependem disso. E se não tiver corrida esse ano, eu vou ter que mandar todo mundo embora. Pois sem corrida, o patrocinador não me paga. Justo, pois se não estou anunciando o produto dele, como ele vai me pagar?

A questão é: como vamos retomar? Vai ser em agosto e vamos finalizar em fevereiro de 2021? Ok. Temos que entender que é uma ano atípico. Não vamos ter férias? Ok. Já falei pros funcionários: “férias não vamos ter. Se precisarmos acabar o campeonato em fevereiro (2021) e começar o outro em março (2021), nós vamos fazer”. Cada um está pagando um preço. Eu o financeiro, de bancar a estrutura sem estar recebendo e eles de perderem as férias de um ano. Mas todo mundo vai sofrer junto.

Outra coisa que eu vejo o pessoal dizer por aí, que está todo mundo no mesmo barco. Não, não está. Está todo mundo na mesma travessia, atravessando o mesmo rio, o mesmo mar, o que é diferente. Uns estão de Iate, outros de barco, de canoa. Outros estão a nado mesmo, sem colete, e ainda levando a família nas costas. E todo mundo quer saber: onde está a outra margem? Desde o cara do Iate, tomando sua cervejinha, até o cara a nado. A margem é aonde? Falta muito? Para onde a gente vai? Ou a gente vai ficar nadando aqui?

A discussão de quem está no Iate pode ser: “vamos desligar o motor e ancorar aqui agora, e voltar à vida normal”. E o cara que está a nado: “amigão, não posso parar aqui senão eu afundo, eu preciso chegar na margem”. A discussão está sendo essa, e está errada. A discussão não é essa. A discussão tem que ser : alguém diz para gente onde está a outra margem. Até que dia vamos nadar, quando vamos chegar, de que jeito voltaremos? E aí a gente volta.

Riscos? A gente quer minimizar os riscos. Adoraria que o Covid nunca tivesse aparecido na vida de ninguém, mas apareceu. Agora, como a gente cuida da saúde de todo mundo? Mas também cuida da cabeça de todo mundo, do emprego de todo mundo, de como as pessoas vão voltar?  Jogador é privilegiado, ganha muito dinheiro. Eu fico puto quando eu vejo um monte de gente perdendo emprego e jogador em cima do contrato. Parabéns para o Fluminense (por ter feito o acordo de redução). O jogador também não está exercendo a sua função. O clube não está recebendo (como deveria) pois não está jogando. A TV não está pagando pois não está transmitindo. Os patrocinadores não pagam à TV pois não está tendo jogo. Mas o clube está pagando o salário.

É difícil fazer contas com o bolso do “aminguinho”. Mas os caras ainda podem falar: “tô no meu direito, esse é meu contrato”. Então, eu sei que é seu direito e que está no seu contrato. Mas vamos usar um pouco mais de empatia, e abrir mão aqui de uma parte se seus salários, pensando naquele pai de família que ganha pouco, e que pode ficar sem seu emprego. Vamos pensar com um pouco mais de empatia e vamos pensar em como retornar.

Ainda assim, Mário: parabéns, está super correto. Não dá para falar: “ah, vamos voltar a treinar porque eu preciso”. Alguém me explica como fazer para voltar a treinar, em segurança. Me explicando, eu volto. E essa é a discussão que está faltando. Como fazer para voltarmos a trabalhar? Se não sabem, procurem um médico que saiba. Procurem as recomendações da OMS. Mas alguém tem que dizer para gente como a gente faz e quando.

Podem até falar que será em agosto. Ok. Já é uma resposta, um planejamento. Daí sentamos aqui, e vamos ver como a gente faz para viver até lá…”

*trecho retirado da entrevista de Cacá Bueno, ao Saudações Tricolores, no programa Papo de Arquiba, por volta de 57″.


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6 thoughts on “O outro lado da margem…. – trecho retirado da entrevista de Cacá Bueno

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