Série ídolos: Preguinho
Há pessoas que nascem com talento; outras com uma insuperável raça; há até quem venha ao mundo com sorte. Contudo, hoje falaremos daquele que nasceu predestinado.
O ano é 1929, véspera de Fla-Flu, jogo válido pelo primeiro turno do Campeonato Carioca.
Vindo da Gávea, chega nas Laranjeiras um telegrama destinado ao atacante tricolor. Tratava-se de uma provocação do goleiro rubro-negro, Amado:
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“És sopa. Amanhã não farás gol.”
Provocação essa que não ficaria barata, e o jogador respondeu à altura:
“Farei dois gols, no mínimo.”
Jogaríamos fora de casa e, ao chegar no campo da Rua Paysandu, este atacante, cujo futuro guardava glórias e alegrias, foi vaiado e insultado na mesma proporção de sua importância. Logo no início do jogo, Amado faria sua primeira defesa e, debochando do ponta de lança tricolor, quicou a bola no gramado algumas vezes. Desavisado de que o jogador também era campeão de atletismo, o goleiro, em um descuido, levaria o primeiro gol da partida, marcado pelo artilheiro tricolor ao roubar e empurrar a bola pro fundo das redes.
Aos 11 minutos do primeiro tempo já estávamos à frente no placar por 2×0, com dois gols do atacante que cumpria sua promessa em um Fla-Flu que acabaria em uma goleada soberana por 4×1. Uma verdadeira humilhação.
Finalizada a partida, o jogador, protagonista do clássico, foi carregado e aclamado pela torcida e, mais tarde, seria descoberto que aquele telegrama havia sido enviado, na verdade, pelo diretor-geral de Esportes do Fluminense, com o intuito de atiçar o atleta.
E não é que funcionou?
Crescido em uma família de tricolores, o ídolo de hoje é João Coelho Netto, o atleta mais completo da história. Filho de Henrique Coelho Netto, ilustre escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, Preguinho praticamente nasceu vestindo a armadura tricolor. Aos onze anos, o multimedalhista-poliatleta ingressaria nos esportes das Laranjeiras, praticando apenas natação, remo, polo aquático, saltos ornamentais, atletismo, basquete, vôlei, hóquei sobre patins e tênis de mesa. Ao todo, foram 387 medalhas e 55 títulos cariocas.
Sem contar que duas de suas conquistas foram no mesmo dia! No dia 19 de abril de 1925, Preguinho, ainda com a medalha no peito, saia tricampeão estadual de natação da praia de Botafogo e ia em direção das Laranjeiras conquistar o Torneio Início do Rio contra o São Cristóvão. O engraçado é que não se questiona como ele conseguiu tal feito, mas como conseguiu se deslocar tão rápido de um lugar para o outro!
Ah, jogou futebol também, e como jogou! Com as bolas nos pés vestindo a amarelinha, foi o primeiro a marcar pelo Brasil em Copas do Mundo e deixou sua marca 9 vezes em 5 jogos. Pelo Flu, foi campeão carioca em 1937 e 38, e marcou 128 vezes em 174 partidas.
Preguinho é daqueles que nasceram predestinados, e que imensa honra torcer pro mesmo clube deste gigante, que amou as nossas cores com a mesma intensidade que marcava seus gols. Seu amor era tanto que, quando se profissionalizou, não aceitou um centavo do clube para jogar no Flu – e hoje tem ídolo querendo fortunas para voltar.
O atleta, que tem um busto na sede do Fluminense, faleceu em 1979 de complicações pulmonares. Seu legado extremamente vitorioso só pode ser explicado por forças sobrenaturais. Quem sabe se, antes mesmo de vir ao mundo, não tenha recebido outro bilhete como o de Amado.
“Eu nem sabia falar direito e o Fluminense já estava inteiro em minha alma, em meu coração e em meu corpo”
ST
