LEONARDO BAGNO – Não basta dizer que o Flu é enorme

Tricolores,
Desde que eu tenho consciência do meu amor pelo Fluminense que eu torço por ele independentemente da situação na qual se encontra. Não só torço por ele como também acho que é possível vencer todo e qualquer adversário por mais difícil que ele seja. Nem que seja de um a zero com gol contra. Afinal, estamos falando de Fluminense, um clube enorme com uma camisa pesadíssima que está acostumada a alcançar resultados impossíveis, e de Futebol, esporte que justamente permite a ocorrência desses resultados impossíveis.
Ontem, no entanto, foi a primeira vez na minha vida de tricolor que eu sequer torci por um resultado impossível. Sentei-me à frente da televisão e fiquei, insensivelmente, olhando para a tela, esperando a eliminação chegar; porque ela era certa; e, como era certa, chegou.
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Não que eu seja vidente. Não é nada disso. A eliminação de ontem começou a ser escrita quando não conseguimos avançar da primeiríssima fase da Sul-americana. E continuou a ser escrita pelos jogos que tivemos contra Volta Redonda, Flamengo (segundo jogo da final do Carioca e o do Brasileiro), Bragantino, São Paulo, Atlético-GO…
Eu estava tão certo da eliminação que cheguei a gargalhar (de raiva, mas a reação foi essa) nas duas falhas do Muriel, que não foram as duas primeiras experimentadas pelo fraco goleiro defendendo o nosso gol. Ele já falhou assim várias vezes em vários jogos e permanece dono da camisa número 1 do Fluminense. Inabalável. Inacreditável. Inadmissível.

Parênteses aqui: antes do jogo, passei rapidamente pela FluTV para conferir um pouco do Boteco Tricolor, do qual tive a honra e o orgulho de participar (obrigado pelo convite mais uma vez, Daniel!) no pré-jogo do Fla-Flu deste Brasileiro 2020. Passei lá porque o convidado era o Paulinho Carioca, por quem nutro sincero carinho pelo golaço de falta marcado por ele e que nos deu o tricampeonato carioca em 1985, em cima do Bangu.
Alexandre, o apresentador do programa e a quem tenho profunda admiração pelo trabalho que desempenha, pergunta para os convidados sobre ídolos. Uma pergunta corriqueira do programa e deliciosa de responder, diga-se. Um dos convidados fala sobre o Paulo Victor, que é simplesmente um dos maiores goleiros da história do Fluminense, que já conta com monstros como Castilho, Félix, Veludo e Marcos Carneiro de Mendonça.
Resposta dada, Alexandre retoma a palavra e diz algo como: “Mas a gente tá bem servido de goleiro também, né? O Muriel é um baita goleiro também, né?”. Claro que não faz sentido algum o programa oficial do Fluminense falar mal do seu próprio elenco. Não está ali para isso. No entanto, assim que eu ouvi tais palavras, fiz pouco-caso delas, balancei a cabeça negativamente e corri com o mouse à procura do “X” para fechar a janela o quanto antes. Alexandre, meu apresentador oficial, cujo trabalho verdadeiramente admiro e que é craque no que faz, vai com calma! Não precisa forçar a amizade, né? Muriel não é baita goleiro nem se colocado debaixo de um gol durante uma partida de futebol de botão. Está arriscado o dadinho bater na mão dele, voltar na “cabeça” de um botão dentro da área e entrar no próprio gol.
Parênteses feito, o Fluminense está tão previsível assim por dois grandes problemas: a fragilidade do nosso elenco, que talvez seja o pior já montado pela gestão desde a época de Walquir Pimentel e a sua política do bom-bonito-e-barato, e a ruindade do nosso técnico, que não conseguiu até hoje implementar um padrão de jogo para o time, que escala pessimamente os jogadores, realiza substituições ainda piores e é medroso demais.

Quanto ao elenco especificamente, é incrível que o Fluminense não consiga achar um goleiro mediano, um lateral direito mediano, um lateral esquerdo mediano, um meia armador mediano e um centroavante mediano para jogar pelo clube. Não é possível que não haja no futebol nacional jogadores que possam atuar sem comprometer. Não é possível que não haja no futebol sul-americano jogadores que possam atuar sem comprometer.
Já quanto ao técnico, é incrível o Fluminense contratar uma pessoa que não tem a menor vontade de sair do jogo com a vitória; que arme um time sem jogada alguma; que não ensine aos jogadores como e para onde correr quando a bola estiver sob a nossa posse; e que não coloque os jogadores nas suas respectivas posições dentro de campo.
O Fluminense passa por uma profunda crise financeira. Sabemos disso. Contudo, isso não pode servir de desculpa e/ou escudo eternos para o que vem acontecendo conosco. Ainda que tenhamos dificuldades financeiras, é perfeitamente possível fazer futebol com pouco capital. Exemplos não faltam no Brasil e no mundo.
Para que isso seja possível, é primordial que, em primeiro lugar, a gestão aceite, já que não temos condições de contratar profissionais caros, todo e qualquer tipo de ajuda de tricolores que sejam capacitados e que queiram ajudar. Não estou falando de empregar essas pessoas. Estou falando de ajuda mesmo. Comissões formadas por tricolores capacitados que possuam o interesse em ajudar o clube de maneira altruísta. E essas pessoas existem! A gestão precisa estar atenta para essas pessoas e até criar um canal de comunicação para que elas possam entrar em contato com o clube e ajudar naquilo que é possível ajudar. Se esse processo já existe, ótimo. Que se intensifique, então.

Além de permitir que essas pessoas se aproximem do clube e ajudem-no, é preciso não só entender que o Fluminense é enorme, mas também comportar-se como gestor de um clube enorme. Não basta discursar; é preciso portar-se como tal. Daí que os profissionais do clube precisam conhecer minimamente a nossa história, bem como precisam ser incentivados e cobrados a buscar grandes feitos que sejam compatíveis com o que somos e queremos ser. As eliminações na Sul-americana e na Copa do Brasil são inexcusáveis e incompatíveis com esse posicionamento. Principalmente pela maneira como o time atuou nas duas oportunidades.
Por fim, o pouco capital que temos para investir em jogadores precisa ser muito bem empregado. As contratações precisam ser pontuais e exatas. Não temos margem para erros. E estamos errando demais há muito tempo.
O trabalho, como sabido, é árduo. Ninguém tem dúvida disso, mas foi para isso que eles se elegeram e foi isso que eles se propuseram a fazer. Portanto, esquivar-se da cobrança não é admissível. Esconder-se nas dificuldades tão menos. Não é postura de quem se diz enorme e de quem quer fazer o Fluminense ainda maior do que já é.
Por isso que, de tudo o que foi escrito por mim neste texto, o que mais tem me incomodado e tirado o meu sono é ver o Fluminense não se portando como instituição enorme que é. Desde a meta desejada pela Diretoria (alcançar a pré-Libertadores, o que vem a ser o objetivo mínimo de 20 entre os 20 times que disputam o Brasileiro), passando pela postura do time dentro de campo, até a conivência da gestão para com esta postura – já que o treinador permanece no comando até o presente momento… Tudo isso nos leva a constatar que se dizer enorme não basta nem faz bem. É preciso se portar como enorme.

Essa mudança no entendimento da nossa cultura precisa ser imediatamente revista. Não podemos aceitar a perda daquela cultura vencedora, que nos definia e que nos alimentava ao mesmo tempo. Porque qualquer coisa diferente disso não é Fluminense. É qualquer outra coisa, menos Fluminense.
O preço a ser pago será justamente o que aconteceu comigo pontualmente nesse último jogo: tricolores anestesiados com os resultados negativos, impassíveis e conformados com a mediocridade que o Fluminense tem se tornado e almejado, o que é ainda pior.
Se e quando esse sentimento se tornar generalizado dentro da torcida – e vem numa crescente, acreditem! -, o Fluminense deixará de ser Fluminense e tornar-se-á outro clube com o mesmo nome, escudo e cores, mas sem a sua essência, que é primordial: a alma esculpida no lema vencer-ou-vencer.
Que esse dia nunca chegue. Apesar de cada vez mais próximo.
Saudações Tricolores,
Leonardo Bagno